Santa Maria de Araras, parte 2: o processo de criação

Por Renato Gameiro
   Quando você exerce sua profissão como agente, de um lado deve se posicionar. No meu caso, posiciono-me ao lado daquele que verdadeiramente está colocando a responsabilidade de seu investimento em minhas mãos e o faz por acreditar em meu conhecimento. Como em um teatro. Vou tentar me explicar melhor.
   Você se coloca na platéia e assiste a um espetáculo, ao qual no final aplaude ou não. Outrossim, seu julgamento tem como base aquilo que aparece à sua frente. Não se leva em consideração que o que foi apresentado no palco é fruto de uma coxia e que muitas horas de ensaios, semanas de treinamentos, meses de construção de cenários, feitura de scripts, escolha de cast. Todas estas ações são necessárias para exigir de você, um simples aplauso.
   Com cavalos de corrida não é distinto.
   Você os seleciona tendo como base aquilo que está sendo colocado a sua frente. E aí fica a indagação: por quê certos haras apresentam melhores resultados que os outros, em pista e no tattersall? Eu não creio que seja apenas o marketing e a genética apresentada no catálogo. Existe todo um trabalho anterior que assegura que o que está sendo apresentado é fruto de muito esforço e conhecimento de causa. Tendo isto como entendido, vou adiante.
   Sou um fã de caderninho do Santa Maria de Araras. E como sempre digo, não falo isto da boca para fora. Vou lá e seleciono elementos de sua élèvage para representar as cores de meus clientes. Logo, querendo ou não, este estabelecimento de cria passa a ser depositário do investimento dos mesmos e dita meu futuro profissional. Por quê? Porque os resultados que obterei com eles ditam se o cliente ficará ou baterá asas e voará.
   Tive o ensejo de minha última vista entrar no âmago dos bastidores do Araras. Estupefei-me. E nada melhor do que apresentar aquilo que Friederich Frey Junior, o veterinário da criação em Bagé, me respondeu e a meu pedido transformou em texto para melhor compreensão minha e daqueles que me leem. Não percamos mais tempo e vamos partir para os ‘finalmente’, pois de ‘entretantos’ o mercado de cavalos de corrida me parece já cheio.
   “Além do notável pragmatismo e doação pessoal do Sr Julio para a criação de seus cavalos. A meu ver, existe uma série de fatores relevantes na criação do Araras, destes farei uma tentativa de elencar os principais. Seleção genética de ‘famílias’, reservando linhagens das quais conhecemos a produção. Sabemos que tipo físico produzem, o que necessitamos melhorar em termos de físico, temperamento, velocidade, resistência. Esse conhecimento, ao longo de décadas, melhora o índice de acerto. 
   Nossa equipe de colaboradores é muito consolidada, temos pelo menos 75% do pessoal com mais de 10 anos no haras. Considero isto importantíssimo, traz o know-how indispensável à atividade, não pode ser comprado, necessita ser cuidadosamente trabalhado ao longo do tempo.
   Trabalhamos sempre buscando a eficiência de cada processo, desta maneira, evoluímos ao longo do tempo em termos de manejo. Com a racionalização das operações diárias, usamos de maneira mais eficiente nossa mão de obra, nossa estrutura e o principal, permitimos um melhor ambiente aos cavalos. 
   Nosso ambiente de criação é privilegiado com pastagens de altíssima qualidade em função das características naturais do ‘pampa gaúcho’ (abrange o sul do Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina) e do melhoramento sistemático que realizamos  ao longo de décadas. Aliado a essas características, particularmente, desfrutamos de uma grande superfície para criação de equinos e bovinos, permitindo sempre um bom manejo nutricional e sanitário.
   As amplitudes climáticas que vão de aproximadamente – 4ºC a 40ºC, de épocas muito secas a períodos extremante úmidos, de solos duros a atoladiços, ajudam na formação de atletas ‘resistentes’.
   Destinamos especial atenção à elaboração dos cruzamentos (principalmente por conhecer a produção de cada uma das nossas éguas), as gestações através de controles sistemáticos, aos partos que sempre são acompanhados e aos potrinhos. Diria que especialmente aos potrinhos, as correções de aprumos, avaliações hematológicas e demais cuidados se iniciam no primeiro dia de vida e permanecem diariamente até a estreia na pista de corrida.
   Mesmo os cuidados no controle ginecológico, através de exames ultrassonográficos, diagnóstico e tratamento de alterações clínicas, preparo para coberturas e pós coberturas sempre focam o resultado final, focam esculpir um atleta vigoroso e competitivo.
   O Araras, mesmo com considerável produção, dedica o cuidado individual a cada animal. Fator fundamental a criação visto a incrível variabilidade que cada égua e potro apresenta quanto aos seus requerimentos diários.
   O cavalo requer um trabalho diuturno, sistemático, ininterrupto e inovador. O Araras se propõe e trabalhar incansavelmente na busca de atender essa demanda, e tem sido, felizmente, agraciado com inúmeras conquistas“, finalizou o veterinário.
   Como sempre procurei explicar em meus textos, a sorte ajuda a quem a faz acontecer. Conhecimento e imaginação serão sempre a base dos mais bem sucedidos empreendimentos. Hoje, usando um linguajar mais popular, o Araras é o Flamengo de nosso futebol. Se organizou melhor, fez o seu dever de casa e domina a situação.
   Sei o que me custa manter meus olhos e mente afiados dia após dia, anos a fio. De repaginar-se todos os dias. De aceitar a visão divergente alheia. De tentar aprender todos os dias. De respeitar o contraditório. E de acreditar que o cavalo pode vir de qualquer lugar. Mas o faz com mais frequência, de alguns.
   E por isto mesmo, seguindo os conselhos de vó Adelina que dizia, “se junte aos bons e terá muita chance de ser um deles”, que invisto no cavalo brasileiro e em especial no Araras, ciente que ali terei mais chances de manter os meus 20 a 25% de acerto em ganhadores de provas de grupo.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado.

Rolar para o topo